por Marina Costa Lobo
Investigadora do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa
Talvez a questão da transparência nunca tenha estado tanto na ordem do dia. No final do ano passado, a 7 de Dezembro de 2010, Julian Assange, fundador do Wikileaks entregou-se à polícia britânica. A caça ao homem tinha começado dias antes, quando aquele site deu início à divulgação de centenas de milhares de telegramas confidenciais enviados pelos serviços diplomáticos americanos colocados em todo o mundo. Assange diz que luta para obrigar os governos à transparência. Desde 2006, a Wikileaks já publicou documentos denunciando abusos de poder por parte de autoridades em todo o mundo. Mas foi em 2010 que este site realmente saltou para a ribalta. Em parceria com cinco dos mais conceituados jornais do mundo (Der Spiegel, The New York Times, Le Monde, The Guardian and El Pais) deu início à divulgação dos telegramas confidenciais do corpo diplomático americano, desencadeando um enorme debate mundial sobre o alcance e os limites da transparência no trabalho governamental.
Em que medida é que as acções do governo e de todo o Estado deve poder ser escrutinado pelo público? Essa informação deve ser disponibilizada mesmo que ponha em causa a segurança das pessoas? E para que serve a informação dada ao público? Que consequências tem essa informação para a relação entre representantes e eleitores? Este episódio serve para ilustrar as dificuldades não apenas em definir os limites da transparência como em transformar o objectivo da transparência num bem público, ou numa mais-valia para a vida política. Este último objectivo parece-me particularmente importante, e é relevante para este conjunto de estudos que aqui se apresenta. A transparência não deve ser um fim em si mesma, mas deve antes contribuir para a alteração de comportamentos e para a melhoria nas relações entre cidadãos e representantes, entre parceiros internacionais, ou entre ONG.
Para que isso aconteça, é fundamental cumprir alguns requisitos de base. Em primeiro lugar, é preciso que transparência não seja equacionada com o dumping de informação. Muitos governos, e instituições em geral, já entenderam que a simples disponibilização de informação, sobretudo se for feita em grandes quantidades, pode servir mais para confundir do que iluminar. Aliás, até certo ponto o próprio caso do Wikileaks ilustra este ponto, na medida em que os documentos tinham de ser trabalhados por equipas de jornalistas para trazer à luz o sentido da informação contida. A internet potenciou muitíssimo a disponibilização de informação. Mas ao mesmo tempo, nunca foi tão necessário a existência de filtros para a compreensão dessa realidade que temos ao alcance de um click.